Roupa Nova segue o baile com vigor entre evocações da memória de Paulinho e os hits infalíveis

Rrupo carioca em show que celebra quatro décadas de sucesso do sexteto formado em 1980

♪ A morte do vocalista e percussionista Paulo César dos Santos (6 de setembro de 1952 – 14 de dezembro de 2020), o Paulinho, enlutou o Roupa Nova há dois anos e desfalcou a formação desse grupo carioca, até então intacta desde a criação da banda em 1980, em caso raríssimo de longevidade no universo pop brasileiro.

Contudo, como a trajetória do grupo nunca esteve sedimentada na figura de um cantor, mas na soma harmoniosa das seis vozes de artistas que também são virtuosos instrumentistas, as estruturas sólidas do Roupa Nova continuaram preservadas, como se viu na noite de ontem, 22 de dezembro, no primeiro dos dois shows do grupo programados pela casa Vivo Rio para este fim de ano (o segundo acontece hoje e, como o primeiro, já está com a lotação esgotada antecipadamente).

Para celebrar quatro décadas de sucesso, a banda acionou a usina de hits e, entre evocações do talento de Paulinho, apresentou show memorável diante do público que superlotou as mesas e camarotes da casa Vivo Rio, na cidade natal do Rio de Janeiro, para ouvir os infalíveis antigos sucessos do Roupa Nova.

O tecladista Cleberson Horsth em ação no show apresentado pelo Roupa Nova na noite de ontem, 22 de dezembro, na cidade natal do Rio de Janeiro — Foto: Ricardo Nunes / Divulgação Vivo Rio

O tecladista Cleberson Horsth em ação no show apresentado pelo Roupa Nova na noite de ontem, 22 de dezembro, na cidade natal do Rio de Janeiro — Foto: Ricardo Nunes / Divulgação Vivo Rio

E eles, os hits, deram as caras no roteiro, sendo que, no bis, a banda apresentou set com sucessos estrangeiros, como Oh, pretty woman (Roy Orbison e Bil Dees, 1964), para lembrar as origens nos bailes cariocas, também evocadas no meio do show com medley de músicas dos Beatles, apresentado antes de a banda reviver a personalíssima abordagem a capella da balada Yesterday (John Lennon e Paul McCartney, 1966).

Poucos cantores ou grupos brasileiros podem se dar ao luxo de fazer show de duas horas com roteiro calcado somente em sucessos. Guilherme Arantes e Lulu Santos podem. O Roupa Nova também pode. E foi o que o sexteto fez ontem para deleite do público que mostrou desde a primeira música, Canção de verão (Luis Guedes e Thomas Roth, 1980), que sabia cantar todas as letras do repertório do Roupa Nova.

Integrado oficialmente ao grupo em junho de 2021, embora já viesse desempenhando antes as funções de Paulinho sempre que o vocalista se mostrava impossibilitado de cantar por questões de saúde, o cantor e percussionista Fábio Nestares se mostrou bem integrado ao Roupa Nova.

Aos 50 anos, Nestares acertou ao cantar com a própria personalidade vocal sucessos como a power balada Volta pra mim (Cleberson Horsth e Ricardo Feghali, 1987) sem tentar imitar o timbre ou canto enérgico de Paulinho, eternizado em gravações de músicas como Linda demais (Kiko e Tavinho Paes, 1985).

Linda demais, a propósito, foi rebobinada no show somente com a voz de Nestares e o toque da guitarra de Eurico Pereira da Silva Filho, o Kiko, cujo virtuosismo já ecoara no solo de Clarear (Tavinho Bonfá e Mariozinho Rocha, 1981), segunda música de roteiro previsivelmente encerrado no clima festivo de Whisky a go go (Michael Sullivan e Paulo Massadas, 1984).

Se o canto das baladas românticas foram como sempre confiadas à voz doce do baterista Sérgio Herval Holanda de Lima, o Serginho, Nestares herdou os rocks e as canções mais animadas.

Se Serginho se equilibrou com precisão entre o canto e a bateria para seguir com a habitual suavidade o trilho melódico de canções como A viagem (Cleberson Horsth e Aldir Blanc, 1994), Anjo (Renato Correa, Claudio Rabello e Dalto, 1983) e Começo, meio e fim (Tavito, Ney Azambuja e Paulo Sérgio Valle, 1979), todas propagadas em trilhas de novelas e até por isso ainda presentes nas memórias afetivas de várias gerações, Nestares se saiu bem como o mestre do baile.

Em cena, Nestares foi aquele que agitou a plateia ao puxar o prefixo de Maria Maria (1976) antes de cantar propriamente a música de Milton Nascimento e Fernando Brant (1946 – 2015), compositores de Roupa Nova (1980), tema que deu nome ao grupo surgido da reunião de integrantes de duas bandas cariocas de baile, Los Panchos Villa e Os Famks.

A rigor, o show foi idealizado para festejar os 40 anos do Roupa Nova – aliás, 42 anos, como ressaltou em cena o falante Luiz Fernando Oliveira, o Nando, cujo baixo foi evidenciado no solo que encorpou Chuva de prata (Ed Wilson e Ronaldo Bastos, 1984), música gravada pelo Roupa Nova no mesmo ano de Gal Costa (1945 – 2022).

Contudo, jamais houve clima de saudosismo ou decadência em cena, talvez porque o Roupa Nova tenha conservado o vigor e nunca tenha deixado de se apresentar para casas lotadas quando parou de emplacar hits nas paradas nacionais.

Somente uma ou outra imagem projetada no telão – como a do clipe de Sapato velho (Mu Carvalho, Claudio Nucci e Paulinho Tapajós, 1978), visto enquanto Serginho deu voz a essa canção lançada em disco pelo Quarteto em Cy, mas amplificada nas vozes harmoniosas do Roupa Nova em gravação de 1981 – evocou o passado, ainda que o encadeamento de hits no roteiro transportasse o espectador para as memórias dos anos 1980 e 1990, décadas em que o som do sexteto foi uma das trilhas sonoras mais populares do Brasil.

O tecladista Ricardo Feghali mostra virtuosismo em show do grupo Roupa Nova que superlotou a casa Vivo Rio na noite de 22 de dezembro — Foto: Ricardo Nunes / Divulgação Vivo Rio

A ideia de apresentar algumas músicas em duplas surtiu bom efeito e contribuiu para dar ar de novidade às canções. Se o baixista Nando defendeu A força do amor (1987) com o tecladista Ricardo Feghali, Serginho cantou Seguindo no trem azul (1985) com o tecladista Cleberson Horsth, parceiro do letrista Ronaldo Bastos nas duas canções.

Com o público renovado a partir do show acústico eternizado em álbum e DVD editados em 2004, de cujo roteiro o grupo pescou À flor da pele (Maurício Gaetani e Dalmo Medeiros, 2004), o Roupa Nova vem seguindo o baile após a morte de Paulinho com a marca de sucesso que garante ao sexteto lugar de honra na história da música brasileira.

Acima de modas e modismos, sempre longe do hype fugaz, o Roupa Nova ainda dá show!

Fonte: G1

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